Na sociedade em
que vivemos, o sexo não é completamente livre. Ele está limitado por uma série
de censuras éticas, morais e sociais, que fazem com freqüência o desejo não se
concretizar como ato sexual, ficando tudo apenas na vontade. Ocorre que estas
censuras são anestesiadas pelo álcool etílico e é por isso que muita gente
associa o exercício de sua sexualidade com a ingestão de bebidas alcoólicas.
Se isto é válido para quase todo o mundo, é
muito mais ainda para o alcoólatra, que tem todo um passado ligado a um
freqüente e intensivo consumo de bebida, sem falar no fato de que o álcool
desencadeia nele uma fantasia de grandiosidade, na qual ele se julga atraente,
quase irresistível e certamente o melhor amante do mundo. Freqüente-mente um
alcoólatra não consegue nem se lembrar de ter tido sexo, sem antes ter bebido
álcool. Esta associação, válida por muitos anos, acaba profundamente marcada em
seu subconsciente.
Por outro lado, a ingestão crônica de grandes quantidades de álcool por
períodos prolongados de tempo, agride diretamente as glândulas sexuais,
provocando sua atrofia; o álcool pode até aumentar o desejo, mas termina
prejudicando o desempenho. Homens alcoólicos, em fase avançada da doença,
diminuem progressivamente sua potência, perdem pêlos, às vezes apresentam até
crescimento mais ou menos acentuado das mamas. Mulheres alcoólicas, podem
perder suas características sexuais secundárias femininas, atrofiam suas mamas,
vêem suas menstruações diminuídas ou ausentes, tornam-se estéreis. No fim da doença alcoólica, fica
freqüentemente difícil distinguir, ao primeiro olhar, quem é homem, quem é
mulher.
Por felicidade, este comprometimento das glândulas sexuais (testículo e
ovário), não costuma ser definitivo, podendo o alcoólatra voltar à sua
normalidade apenas parando de beber. Só que isto não acontece da noite para o
dia, a agressão geralmente foi muito prolongada e durou muitos anos. A
observação clínica mostra que o prazo de recuperação é variável, mas costuma
oscilar entre 3 e 6 meses de abstinência. Reconheço que o problema é de difícil
aceitação, para o doente: ao parar de beber, o alcoólatra pela primeira vez
lúcido, depois de muito tempo, descobre estar impotente e se desespera. Três a
seis meses é muito tempo, para quem deseja soluções rápidas. Todo o seu
subconsciente associa sexo com álcool, faz parte de toda a sua vida
sexual. Existe uma vòzinha compulsiva
dentro dele, dizendo que ele vai conseguir, se antes tomar uns goles. Tudo
isto, mais a insegurança, os medos, o orgulho ferido, a revolta existentes
neste período inicial de abstinência, levam com freqüência a uma recaída. É
claro que voltar a beber não soluciona coisa alguma, só agrava o problema cada
vez mais, mas não falta quem venda na rua todo o tipo de garrafadas, vinhos e
tônicos (sempre contendo álcool), que falsamente prometem uma recuperação da
potência. É importante que o alcoólatra seja alertado contra este canto de
sereia, senão certamente irá recair.
A única
possibilidade de recuperação física exige um período de abstinência um pouco
mais prolongado e há que se ter a necessária paciência para esperar por ela. É
claro que pode haver mais algum outro fator influindo, diabete ou lesão
vascular, por exemplo, cujo tratamento depende de uma ida ao médico e de
tratamento apropriado. O alcoólatra que esteja nesta situação não deve deixar
de fazer um bom exame geral, para ver se não há outras doenças associadas.
Sexo porém não é só uma atividade física. Há todo um clima amoroso
envolvido, uma sedução preliminar, que é da maior importância. Existem
alcoólicos que nunca tiveram relações em toda a sua vida, sem antes beber,
desde sua adolescência. Agora, homens maduros, vêem-se diante da perspectiva de
fazê-lo sem álcool, como se fosse a primeira vez, como se tivessem de aprender
como é que se faz para namorar.
Mesmo quando o alcoólico ainda conseguiu manter uma relação estável, os
laços afetivos costumam estar severamente atingidos. Por exemplo, uma mulher
não alcoólica, que vê seu companheiro chegar à noite bêbado, sujo, cheirando
mal em casa, vomitando e depois desmaiando numa cama, tem todos os motivos para
não gostar de fazer sexo com ele e sentir até repugnância física. De repente,
este alcoólico diz para ela não estar mais bebendo mais, que está se
recuperando, digamos dentro de uma sala de Alcoólicos Anônimos. Provavelmente ela já ouviu muitas juras e promessas
não cumpridas, tendo todo o direito de estar descrente de que desta vez é para
valer, podendo ainda estar adoecida de raiva e ressentimentos, criando-se um
clima absolutamente impróprio para qualquer relação amorosa. Também aí, só o
tempo pode ajudar, à medida que a recuperação se torne mais consistente.
Em resumo: a sexualidade está prejudicada no alcoolismo por
comprometimentos físicos, psíquicos e espirituais e só uma recuperação nestas
três áreas, aliada ao fator tempo, pode levar novamente à normalidade
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